Você já se perguntou como algumas músicas conseguem surpreender nossos ouvidos com harmonias inesperadas e emocionantes? Bem-vindo ao fascinante mundo do empréstimo modal! Neste post, vamos mergulhar fundo nesse conceito musical que tem o poder de transformar progressões comuns em experiências sonoras únicas. Seja você um músico iniciante, um profissional experiente, prepare-se para descobrir como pequenas mudanças harmônicas podem gerar grandes impactos em sua música.
Um Acorde Fora da Caixa
Imagine-se ouvindo “In My Life” dos Beatles pela primeira vez. A música está em Lá maior, tudo flui suavemente, quando de repente… Bam! Um acorde de Ré menor aparece, como se estivesse perdido. Mas não está. Esse “intruso” é na verdade um exemplo brilhante de empréstimo modal.
Em Lá maior, esperaríamos um Ré maior no quarto grau, mas o uso do Ré menor, que pertence à escala paralela de Lá menor, adiciona uma profundidade e melancolia única à canção.
Este pequeno desvio da norma não apenas enriquece a música, mas também nos mostra como ideias inovadoras podem surgir quando ousamos sair do convencional.
Exemplo de Empréstimo modal no IV grau da música My Life – Beatles
Para melhor entender, vamos considerar o exemplo da escala de dó maior e dó menor. A escala menor também é chamada de modo eólico e daí o nome empréstimo modal. Estamos buscando um acorde no campo harmônico de outro modo que não o jônico (escala maior). Na escala de Dó maior todas as notas são naturais e, portanto, irão gerar acordes naturais. Já na escala de dó menor a terça, a sexta e a sétima são menores como visto na figura a seguir.
Escalas paralelas maior e menor
Entre o Maior e o Menor
Algumas músicas são verdadeiros camaleões harmônicos, transitando tão habilmente entre escalas maiores e menores que fica difícil dizer se está no tom maior ou menor.
Nessas composições, o empréstimo modal é usado de forma tão equilibrada que cria uma espécie de “zona neutra” harmônica. Não é maior, não é menor, é… algo único.
A canção Hey Joe de Jimmy Hendrix é um excelente exemplo disso. O blues por si só mistura escalas maiores e menores. Nesta canção de Jimmy Hendrix há acordes que pertencem à escala de Mi maior e outros que pertencem à escala de Mi menor. A tônica Mi maior parece definir a escala maior, mas os acordes de dó maior, Ré maior e Sol maior não fazem parte da escala de mi maior ( E, F#, G#, A, B, C#, D#).
Trecho da canção Hey Joe de Jimmy Hendrix
No blues, acordes e notas de escalas maiores e menores convivem em harmonia (literalmente!), criando tensões e resoluções que são a alma do gênero.
Além do Maior e Menor: Explorando Outros Modos
Quando falamos de empréstimo modal, muita gente pensa apenas em pegar emprestado da escala maior ou menor paralela. Mas e se eu te disser que há um mundo inteiro de possibilidades além disso?
Jônico, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio. Esses são os sete modos da escala maior, cada um com sua própria “personalidade” harmônica. Usar acordes desses modos em sua música é como adicionar novos temperos a uma receita já deliciosa.
Por exemplo, pegar um acorde do modo frígio pode trazer um sabor exótico e misterioso à sua progressão. Já um acorde do modo lídio pode adicionar um toque de brilho e elevação.
Empréstimo Modal na Prática: Exemplos Práticos
Vamos dar uma olhada em como alguns artistas famosos usaram o empréstimo modal para criar músicas memoráveis:
“Light My Fire” (The Doors): A música está em Lá menor, mas usa um acorde de Fá# menor, que vem do modo paralelo de Lá maior. Isso adiciona um toque de exotismo à progressão.
Veja exemplos com empréstimo Modal e sem Empréstimo Modal para essa música a seguir:
Exemplo de Light My Fire sem substituir pelo acorde de empréstimo modal
Exemplo de Light My Fire com acorde de empréstimo modal
“Are You Gonna Be My Girl” (Jet): Esta música é um exemplo perfeito de como misturar acordes de escalas maiores e menores pode criar uma sonoridade única e cativante.
“Gimme Shelter” (The Rolling Stones): Aqui temos um caso interessante onde o acorde tônico é maior, mas a maioria dos outros acordes vem da escala menor paralela.
Estes exemplos mostram como o empréstimo modal pode ser usado de formas sutis ou ousadas para criar texturas harmônicas ricas e interessantes.
Cuidado com a Tônica e com os Subdominantes
Se a música é percebida como alegre ou positiva e está no tom maior, uma mudança dramática na tônica a deixará mais triste e sombria. Caso essa mudança não seja proposital, evite substituir a tônica. O mesmo é válido para as subdominantes ou quinta da escala, já que este é um acorde de tensão que prepara para resolução.
Alterar a tônica pode confundir a percepção do ouvinte e mudando a qualidade do acorde subdominante pode eliminar a tensão que pede resolução. Se trocamos o acorde V7, perdemos a cadência dominante que define a harmonia no tom maior.
Dicas para incorporar o Empréstimo Modal em Suas Performances
Comece devagar: Experimente substituir apenas um acorde em sua progressão por sua versão de outro modo.
Cuidado com a tônica e a subdominante
Explore os modos: Familiarize-se com os diferentes modos e suas sonoridades características.
Use sua intuição: Às vezes, o que soa “errado” na teoria pode soar incrível na prática. Confie em seus ouvidos.
Estude as grandes composições: Analise como seus artistas favoritos usam o empréstimo modal.
Pratique, pratique, pratique: Como tudo na música (e na vida), a prática leva à perfeição.
Referências
Mulholland, J., & Hojnacki, T. (2013). The Berklee Book of Jazz Harmony. Berklee Press.
Levine, M. (2011). The Jazz Theory Book. O’Reilly Media, Inc.
Nettles, B., & Graf, R. (1997). The Chord Scale Theory & Jazz Harmony. Advance Music.
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