O que é e pra que serve a medida de decibeis?

Foto: Bruno Glatch (Pixabay)

É importante conhecer alguns conceitos básicos sobre áudio para quem vai gravar, mixar ou masterizar áudios. Comecemos pelo conceito de decibel que descreve de forma bastante eficiente nossa percepção em relação ao som. Quando ouvimos uma música ou um ruído, nosso ouvido capta a pressão do ar e o converte em sinais elétricos que são enviados ao cérebro. As variações de pressão do ar são percebidas de forma não linear, ou seja, quando há aumento ou diminuição da pressão ou potência do som nossa percepção de intensidade segue uma escala logarítmica, a mesma usada para medir terremotos. vamos usar essa analogia para entender este conceito. Um pequeno tremor pode ser classificado como 3 na escala Richter pode ser sentido mas não causa danos,  um tremor de escala 4 pode ter choque entre objetos e um tremor na escala 5 pode causar danos a um edifício. O que quero mostrar é que a força necessária para classificar um tremor aumenta muito mais do que o que a escala mostra. O aumento da destruição é exponencial e matematicamente as funções exponenciais são resolvidas com o uso do logaritmo. Bem, isso é só pra explicar que quando ouvimos um som que está a um nível de 50 dB (decibéis) seria como o barulho de chuva que é bastante agradável, mas se dobramos para 100 dB, a nossa percepção é um som que é muito mais que o dobro, ou seja, 100 dB é o ruído de um helicóptero. Mas afinal o que é o decibel? Na verdade, decibel não é uma unidade física como as outras, ele é adimensional, mas convencionou-se a dar um nome a esta escala para fazer referência ao som, da mesma forma que a escala Richter relaciona-se a tremores. O que a escala mede na verdade, é a variação da intensidade do comparando-a com uma intensidade de referência. A unidade é uma homenagem a Alexander Graham bell, mas ao expressar esta escala em Bels os valores calculados são muito pequenos, então convencionou-se a usá-los multiplicados por 10. Assim como dm é a décima parte do metro, decibel é a décima parte do Bel, ou seja, 0,1 m é o mesmo que 1 dm e 01, Bel é o mesmo que 1 dB.  A referência de pressão sonora para o silêncio é um número extremamente pequeno, mas não é zero porque o que vamos analisar é a razão entre a intensidade que queremos medir e a nossa referência ou I/Iref, e se você se lembra das aulas de matemática o denominador não pode ser zero e da mesma forma, o logaritmo também não.

Em se tratando de ruído, o que se deseja é atenuá-los e para isso é preciso medir a pressão sonora e representá-la na escala de decibéis o que é feito usando-se um decibelímetro. Há diversos aplicativos de celular que funcionam bem para medições de campo. Para o caso de medições com maior precisão ou para laudos é necessário um equipamento calibrado. Para quem quer tocar sua música e não incomodar os vizinhos, ou se vai rolar aquele ensaio até altas horas é importante medir a intensidade sonora na divisa do seu imóvel para evitar maiores problemas. Para se ter uma ideia de que valores são aceitáveis, a legislação brasileira baseia-se na Norma Brasileira (NBR) 10.151/2000, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). de acordo com esta norma, o ruído em áreas residenciais não deve ultrapassar  55 decibéis para o período diurno, das 7h às 20 horas, e 50 decibéis para o período noturno, das 20h às 7 horas. Se o dia seguinte for domingo ou feriado o término do período noturno não deve ser antes das 9h. Já as regras condominiais regulamentam a limitação do barulho após às 22h. Para poder tocar aquele som sem reclamação, então, é preciso fazer o isolamento acústico do local.

Muita gente confunde isolamento acústico com tratamento acústico, mas eles são bastante diferentes. O isolamento acústico vai barrar o som enquanto o tratamento vai eliminar problemas indesejáveis como por exemplo a reverberação, que é o eco, durante as gravações. Quando o assunto é não incomodar, meça o nível de intensidade sonora dentro do local e depois do lado de fora com as portas fechadas. Depois meça na divisa da propriedade que é onde deve atender a lei. Naturalmente, dentro do local onde a banda está tocando as medições serão superiores aos 50 dB permitidos em áreas residenciais, mas se ao fechar as portas e janelas este valor não for atingido você precisa de um isolamento. Alguns materiais ajudam bastante isolar o som tais como paredes sólidas, quando for possível paredes duplas, revestimentos com lã de rocha, etc. No entanto, o vilão do isolamento acústico é o vazamento do som através de frestas, fechaduras, janelas, etc. Para um bom isolamento é preciso gastar um pouco. Portas e janelas com vedação de borrachas, vidros duplos ou preenchidas com lã de rocha são algumas das soluções. Em geral é possível minimizar com alguns truques, mas para um isolamento bem feito é necessário contratar um profissional.

Para se ter uma ideia dos níveis de ruído, vamos comparar os níveis de decibéis com diversas situações do dia a dia:

Cochichar – 10 dB

Conversa – 20 dB

Bebê chorando – 55 dB

cachorro latindo- 65 dB

ruído de moto – 95 dB

Banda tocando – 110 dB

Britadeira – 130 dB

Turbina de avião- 135 dB

Se o assunto não é incomodar os vizinhos, mas se é o contrário, ruído de trânsito, conversas, crianças brincando podem atrapalhar seu trabalho de gravação. Nestes casos o isolamento também é importante. Já o tratamento do som irá melhorar a gravação. O tratamento mais comum é o uso de espuma acústica que vai absorver a energia acústica do ambiente e “matando” a reverberação. Há casos em que o reverb é necessário ou que se deseje que o som gravado tenha mais brilho. Enfim, há uma série de parâmetros a serem analisados de acordo com cada caso e da mesma forma, há uma infinidade de soluções para cada tipo de problema o que também requer a contratação de um profissional se o seu projeto é algo profissional. Para estúdios caseiros vale a tentativa e erro. Coloque mais ou menos espuma, grave, ouça, altere, grave de novo.

A unidade de decibéis também são utilizadas nos softwares de gravação de áudio, mas nestes casos, os valores que aparecem não são valores de nível de som, mas de ganho e atenuação. Quando fazemos uma gravação de áudio, o sinal som é convertido em sinal elétrico que pode inicialmente é analógico e então é convertido para sinal digital. Este sinal traz informações de para a interface de áudio que então converte o sinal analógico em sinal digital. Se você gravou o seu áudio  com volume baixo ele será reproduzido de acordo com o volume gravado. Os decibéis que aparecem no software de gravação (Audacity, Logic, Pro Tools, etc) mostram em geral valores negativos porque uma vez que você fez a gravação e ela foi convertida para sinal digital, o 0 dB significa que você está no máximo de sinal que veio da gravação. Estes valores, então, mostram a variação dos níveis de intensidade sonora. Zero significa que não foi nem atenuado nem aumentado. É possível aplicar ganhos que são valores positivos de decibéis, mas é preciso ter muito cuidado porque na verdade, quando você aplica ganho no seu áudio, você irá aumentar tudo que estiver abaixo do limite de pico ( maior valor que define o 0 dB), mas todos os outros valores que já estão no máximo serão achatados e você irá distorcer o som. Já a atenuação irá reduzir ruídos e deixar o volume do som dentro de valores confortáveis de forma a não “estourar”. Há diversas ferramentas para alterar o som de uma gravação, mas é preciso usar com cautela e saber como usá-la para não distorcer o som e perder qualidade.

O Master Handbook de Acústica traz conceitos bastante detalhados de acústica e está disponível em inglês no formato livro ou e-book.

O que é série Harmônica na música?

Qual a diferença entre ouvir uma boa música e ouvir outros tipos de som? Uma sirene, por exemplo, ou o choro de uma criança. Por que a música agrada aos ouvidos enquanto outros tipos de som provocam irritação? Por que a combinação de alguns sons agradam aos ouvidos e outros não?

Uma questão de física

Tudo isso tem a ver com a física do som, ou seja, a forma como as ondas sonoras vibram deslocando o ar e formando ruídos ou notas musicais. A acústica é o ramo da física que estuda os fenômenos do som e harmonia é uma das matérias que trabalha com a combinação das notas musicais de forma a usar as combinações que agradam ao ouvinte.

Qualquer som, seja ele um ruído ou uma nota musical, é produzido pela vibração do ar. Ao tocarmos, por exemplo, uma corda do violão, ele produções vibrações no ar que se repetem. É mais ou menos a mesma situação quando jogamos uma pedra na água e vemos a formação de ondas que se propagam. No nosso caso, nosso meio não é a água, mas o ar. Todo som vibra a uma determinada frequência. Mas o que é frequência? É o número de vezes que uma determinada onda sonora se repete por segundo. Cada ciclo por segundo é chamado de Hertz em homenagem ao físico alemão Heinrich Rudolf Hertz que deu grandes contribuições científicas na área do eletromagnetismo.

Frequências audíveis

Os seres humanos ouvem frequências que vão de 20 a 20.000 Hz (ou 20 kHz = 20.000 Hz).  Bebês chegam a ouvir até 20 kHz, mas à medida que nos tornamos adultos vamos perdendo a habilidade de ouvir frequências mais elevadas. Isso explica o uso de alguns toques de celular em altas frequências impossíveis de serem ouvidas pelo professor, mas facilmente ouvidas pelos adolescentes (Ah, e pelos cães também).

A nota lá do diapasão está na frequência de 440 Hz porque produz um vibração no ar de 440 vezes por segundo. A série harmônica é formada pela sucessão de notas que possuem frequências múltiplas. Se tomarmos o a nota lá do diapasão com frequência de 440 Hz teremos as seguintes frequências múltiplas a ela : 110 Hz, 220 Hz (dobro da fundamental), 330 Hz (triplo da fundamental), 440 Hz (quatro vezes a fundamental, que é nosso lá), 550 Hz (cinco vezes a fundamental), e assim até o infinito. Então a série harmônica é uma série de frequências múltiplas (ou notas notas musicais) infinta.

A contribuição de Pitágoras

Mas o que há de especial com estas notas? Quando tocamos a corda do violão, a nota produzida não é apenas a fundamental, ou seja, no caso da nota lá, outras notas vão soar juntamente com ela reforçando e criando uma sensação de preenchimento que agrada aos ouvidos.

A primeira pessoa que percebeu esta relação entre os harmônicos nas notas musicais foi Pitágoras, na Grécia antiga. Sim, é o mesmo cara do teorema, mas isso já é outra história.

Pitágoras percebeu que ao esticar uma corda o seu som variava em função da tensão aplicada, espessura da corda e o seu tamanho.  Então ele começou a fazer experimentos com uma corda esticada e percebeu que se ele a dividisse no meio, ou seja, se tivesse uma corda com exatamente a metade da primeira o som emitido parecia ser o mesmo, mas era mais agudo. Pitágoras estava descobrindo o conceito de oitava. Ele fez outros experimentos, dividindo a corda em 3 partes, 4 partes e cinco partes e percebeu que havia uma consonância entre os sons, ou seja, se combinados eles agradavam aos ouvidos.

O experimento de Pitágoras

Uma forma de verificar o experimento de Pitágoras é medir o comprimento de uma corda do violão com uma fita métrica. Se você fizer isso, vai perceber que a metade entre as extremidades da corda é exatamente a casa 12, que é a oitava da nota solta. Ou seja, se tocamos a nota lá solta e depois pressionamos na casa 12 temos o lá em 440 Hz para a corda solta e o lá em 880 Hz para a corda pressionada na casa 12. Podemos verificar a frequência da nota instalando no celular um aplicativo de afinação que mostra a nota e sua frequência.

Se agora dividimos a corda em três partes, vamos pressionar a casa 7 que é a nota mi que é ouvida quando os outros 2/3 da corda está vibrando. Sabemos que a nota mi é a quinta nota da escala de lá maior e a frequência do mi é 330 Hz que é múltipla de 440 Hz.

Vamos montar em uma tabela os harmônicos e suas respectivas notas:

110 Hz – A1
220 Hz – A2 (oitava justa)
330 Hz – E3 (quinta justa)
440 Hz – A3 (oitava)
550 Hz – C#4 (terça maior)
660 Hz – E4 (quinta justa)
770 Hz – G4 (sétima menor)
880 Hz – A4 (oitava)
990 Hz – B4 (segunda maior)
1100 Hz – C#5 (quinta justa)
1210 Hz – D# (4 aumentada)
1320 hz – E5 (quinta justa)
1430 Hz – F#5 (sexta maior)
1540 Hz – G5 (quinta justa)
1650 Hz – G#5 (sétima maior)
1760 Hz – A5 (oitava)

Consonância e Dissonância

Nossa série harmônica então fica: 1,8,5,8,3,5,7,8,2,5,4,5,6,5,7,….

Desta forma, podemos montar nossa série harmônica em qualquer escala. Na escala de dó maior ficaria: C, C, G, C, E, G, Bb, etc.

Com isso podemos definir o que é consonância e o que é dissonância.  Consonância são sons que melhor combinam criando uma sensação agradável ao ouvi-los e são formados pelos intervalos mais próximos à fundamental enquanto dissonância são sons que criam um choque ou uma tensão ao serem ouvidos e estão mais afastados da fundamental quando consideramos uma série de frequências múltiplas.

Mas pra que serve isso? Além de nos ajudar a entender as relações harmônicas e a formação dos acordes, se levamos em consideração as consonâncias e dissonâncias podemos usá-las para transmitir as emoções que desejamos em nossa composição. Vamos usar alguns exemplos: Em uma música composta para canto coral, o que se deseja é uma maior consonância entre as vozes, então ao compor um arranjo que prioriza consonâncias, ou seja, terças, quintas, oitavas e sextas entre as vozes, teremos uma música que ao ser ouvida será facilmente assimilada e considerada agradável. Agora imagine que estamos compondo uma trilha sonora para um filme de suspense e o que queremos é criar uma tensão, criar um ambiente mais sombrio, então fazemos uso das dissonâncias. A bossa nova e o jazz são exemplos de gêneros musicais em que o uso das tensões são usados para enriquecer a harmonia e criar variações que aos serem resolvidas nas consonâncias enriquecem a composição. Enfim, não há certo ou errado. Tudo depende do resultado final que se quer.  Outro ponto importante ao se falar de série harmônica é o seu papel na definição do timbre de um instrumento. Quanto mais harmônicos são gerados, mais encorpado e rico é o som.